Expansão São Paulo: quem falou que Monotrilho é a solução?

Com a escassez de recursos para investimentos em infraestrutura de transporte de alta capacidade, não podemos correr o risco de errar nas escolhas que oferecemos à população.

Sendo a zona leste de São Paulo a segunda mais populosa e carente de transporte público, os governos têm a responsabilidade de não se aventurar em testar modais que poderão frustrar a expectativa daquela população, já tão castigada com um sistema de transporte caro, desconfortável, inseguro e que impõe viagens de até 3 horas por dia até o centro da cidade.

Durante anos, a população da região se mobilizou para sensibilizar o poder público sobre a importância da construção de uma linha de metrô que atendesse suas necessidades, ligando o centro à Vila Prudente, Parque São Lucas, São Matheus e Cidade Tiradentes.
Ocorre que não há planejamento de longa duração nos planos de governos, o que promove uma instabilidade administrativa e financeira.

Igualmente ruins, portanto, são os projetos que surgem, pois, embora sejam apresentados como soluções definitivas para antigos problemas, têm custos elevados e não consideram os riscos.

Em São Paulo, estamos prestes a vivenciar uma destas experiências, que tornou-se a solução para todos os males do transporte público, do trânsito e da mobilidade urbana.

Em visita ao Oriente, políticos dos governos do estado e do município foram apresentados ao monorrail (monotrilho), e após apresentações de empresários ávidos a atravessar oceanos para desfrutar parte dos recursos governamentais, se convenceram de que estavam diante da salvação da metrópole paulistana.

Ao retornarem, quase como um transe, passaram a impor aos técnicos do Metrô e da SPTrans a substituição de linhas de metrô e corredores de ônibus por este novo modal, sem antes discutir os impactos de sua implantação e as limitações do sistema, e sem avaliar as tendências internacionais que estão substituindo este modal por outros menos agressivos urbanisticamente e de maior capacidade de transporte.

A implantação do monotrilho de Vila Prudente até Cidade Tiradentes significará um dos maiores erros da falta de política de planejamento, com impactos desastrosos para a região, para a população e para o sistema de transporte já instalado.

Para não ficarmos só no prognostico catastrófico, analisemos dados existentes e os números que o próprio governo trabalha.

A demanda da linha Vila Prudente/Cidade Tiradentes é de mais de 600 mil passageiros por dia, com um carregamento de 48 mil passageiros/hora/sentido (p/h/s) no horário de pico.

Internacionalmente, este volume deveria ser transportado por um sistema de alta capacidade. No mundo, não existe nenhum monotrilho com este carregamento. O sistema mais carregado em funcionamento fica na China, operando no limite de 30 mil p/h/s.

Outro desafio é atender a exigência do intervalo de 75 segundos entre trens, que também não é praticado em nenhum outro sistema de transporte no planeta. O monotrilho para a Cidade Tiradentes, que irá operar sem condutor, deverá adotar o sistema de sinalização CBTC (Comunications Based Train Control), que está em desenvolvimento e tem apresentado vários problemas.

Além disso, há problemas mais graves e que o governo não responde, como a integração entre o monotrilho e o Metrô na estação Vila Prudente.

Com a extensão da Linha 2-Verde até o Tiquatira, a Linha 15 Branca deverá ser a mais carregada do sistema, com um volume de 1,4 bilhões de passageiros ano, passando a Linha 3 Vermelha.

Partindo de Tiquatira, com um carregamento de 27 mil p/h/s, proveniente da integração com a CPTM, e agregando mais 19 mil p/h/s na integração com as estações Penha do Metrô e da CPTM, o sistema chegará à estação de Vila Prudente com 60 mil p/h/s, perto de sua capacidade máxima, que é de 66 mil p/h/s.

Partindo do pré-suposto de que o monotrilho consiga cumprir a tarefa de transportar 48 mil p/h/s, e considerando que apenas 38 mil p/h/s cheguem à estação Vila Prudente, ainda questionamos como estes 38 mil passageiros conseguirão acessar o sistema metroviário, já carregado em seu limite, em uma estação que não foi projetada para tal?

Para piorar, o monotrilho proveniente de São Bernardo do Campo também deverá despejar na estação Tamanduateí aproximadamente mais 19 mil p/h/s.

Com uma carência de transporte de alta capacidade para o extremo leste da cidade, o governo erra ao levar uma linha de metrô por uma região nobre, atendida por sistemas de transporte de baixa capacidade, que bem dimensionada atenderá perfeitamente as necessidades daquela localidade, sem contar que 80% dos passageiros que se utilizarão desta extensão da Linha 2-Verde, a partir de Vila Prudente até Tiquatira (Linha 15 – Branca), serão retirados do interior do Metrô (Linha 3 – Vermelha) e CPTM (Linhas 12 – Safira e 11 – Coral).

O Metrô para Cidade Tiradentes atenderia com segurança, conforto e rapidez toda a população daquela região; aliviaria em alguns milhares de passageiros a Linha 3 Vermelha, diminuindo sensivelmente seu carregamento; admitiria com melhor fluidez os passageiros provenientes do monotrilho de São Bernardo do Campo e não acarretaria transtornos provenientes de uma linha saturada, a exemplo dos problemas enfrentados cotidianamente na Linha 3 – Vermelha.

Além do mais, os recursos seriam mais bem aplicados, inclusive na melhoria dos sistemas da CPTM (Linhas 12 – Safira e 11 – Coral) e do Metrô (Linha 3 Vermelha).

* Manuel Xavier Lemos Filho é Técnico de Projetos do Metrô, diretor da Fenametro e do Sindicato dos Metroviários de São Paulo